27 de jan. de 2011

Meramente fingindo

Eu sabia de tudo e não pude evitar.
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Era uma madrugada de outono. Você e eu, sentados no topo de um telhado baixo. Estava frio, você me deu o casaco e me abraçou de repente. O seu corpo no meu, um calor agradável. Estamos contando histórias de conto de fadas e fingindo que acreditamos em toda essa palhaçada. Nossos olhos brilham no escuro da noite. Dormir não é uma possibilidade. Estamos no telhado, observando a pequena cidade em paz. Daqui, podemos ver vidas. Gente de verdade. De um lado, alguns amigos que parecem bêbados e felizes, abraçando uns aos outros como velhos amigos fazem. Do outro, aquele casal de estranhos que se ama por uma noite e que, provavelmente, amanhã nenhum lembrará do outro. Mas que, por agora, eles estão indo pra casa apaixonados. A polícia dá voltas, como se algo tivesse que ser resolvido. E, incrivelmente para uma madrugada de sexta-feira, não há. Parece que o mundo está em nossa mesma sintonia.


Acabamos de sair de um bar. Ir pra casa não é uma opção. Está frio e você está fumando um cigarro. Escondemos bebidas na bolsa e no casaco. Não há nada que eu queira a mais. Estamos advinhando desenhos em nuvens. Só pra passar o tempo. Você me conta histórias da sua vida e eu te divirto com algumas das minhas noites mal dormidas. Num minuto ou noutro, você me beija. Um toque suave, delicado e ao mesmo tempo selvagem. Estamos tranquilos. Somos amantes.

Sem que você perceba, eu me paraliso e me fixo no seu sorriso mágico, que me faz acreditar que tenho tudo comigo. E, de fato, eu tenho. Eu senti sua falta e achei que fosse passageiro. Me enganei. Pensei em você e em estar ao teu lado quase todas as noites, antes de adormecer. Nada do que você dissesse ou não fizesse iria me livrar. Eu precisava correr pra pegar o primeiro vôo de volta e te encontrar mais uma vez. Você não me garantiu nada e eu sabia das minhas condições. Eu decidi pôr tudo em risco. Deu certo e eu estou aqui. Você segurando minha mão e eu no aconchego do teu colo, sentindo a tua respiração tranquila. Tudo está certo, tudo está exatamente como eu desejava e nada me abala agora. Olho em volta e não há nada que eu queira acrescentar. Sim, eu tenho tudo.

Mas aí, algo me cutuca. Me remexe. Me sacode. Tá, tudo bem. Não é nada disso. Eu só queria fingir um pouco e ser feliz.
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24 de jan. de 2011

Distração

O papo entre amigas

Você nunca sabe o que realmente rola numa conversa entre amigas. Elas eram três nesse dia. Era de manhã cedo em Fortaleza, num dia de semana e no caminho para a faculdade.

- É que ele perguntou por mim, sabe? Mas porque, se ele não me liga, não me procura? Perguntar só por perguntar? Melhor não né?! – Uma dizia.

- A festa de sábado foi o máximo! Conheci um cara muito gato e trocamos telefones! Será que ele vai ligar? E eu? Será que ligo se ele não ligar? – A outra se perguntava.

-Ah, ele demonstra que quer, mas tem namorada. Qual é a dele? Dá bola, fica de conversinha comigo, mas não larga a outra! – A terceira lamentava.

O trânsito estava um horror, como de costume. O caminho era mais longo, pois a que estava dirigindo precisou deixar a irmã mais nova no colégio antes de ir pra faculdade. A conversa estava irresistível.

- O problema é que ele não quer. Pergunta por mim, mas na verdade é só por costume. Afinal, dizem que quando o homem está interessado ele sabe como conseguir, não é? – A primeira desabafou.

- O problema é que ele é da farra! Por isso ele ainda não me ligou, já deve ter conhecido outras! Será que eu ligo? – Ela precisava se controlar.

- O problema é que ele quer as duas! Só pode ser! Ou, talvez, esteja me deixando na reserva pra quando terminar o namoro já me ter disponível! Mas nem que "a vaca tussa!" – Era uma ilusão.

Havia apenas uma explicação para o problema das três. O cara tava em outra, ou, em outras. Qualquer um de fora seria capaz de enxergar essa agravante com facilidade. E, no fundo, elas também. Difícil era fazer com que três mentes femininas pensantes, assumissem isso.
Dessa forma, pra quem mesmo sobra toda a culpa?? As próprias mulheres!

- O problema é a irmã dele! Ela não gosta de mim e com certeza fica tentando convencê-lo de não me procurar. Isso não é justo! – Pobre da irmã.

- O problema são as outras! Gente são quase 200 mil mulheres a mais que homens só em Fortaleza. Sem contar, que é um bando de oferecidas! – Pobre das outras.

- O problema é a namorada! Ela sempre se faz de vítima pra que ele tenha pensa de terminar com ela. – Pobre da namorada.

Conversa vai e conversa vem. A discussão estava séria. Pode imaginar três mulheres iludidas juntas? É muita conversa em jogo e isso requer muita atenção e energia. O tempo estava passando e elas estavam cada vez mais falantes. Era impossível chegar ao fim daquela conversa se algo mais extraordinário que três homens desinteressados não surgisse pelo caminho. A conversa terminou. Logo, algo de extraordinário aconteceu.

RIO DE JANEIRO, SALVADOR OU RECIFE




Sim, era uma placa bem no meio da avenida. Elas erraram feio o caminho e nem perceberam que já estavam dirigindo por mais de uma hora. Resultado? Elas perderam a prova do primeiro horário e, ainda assim, caíram na gargalhada. E nessa hora, homem nenhum se mete entre elas.

E só quem tem conversas entre amigas é que entende!


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7 de jan. de 2011

Ressaca emocional

Poderia você me entender?
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Estava cansada e, pior, de ressaca emocional.

-Sabe quem perguntou por você ontem?

Tá, era tudo o que eu precisava para dormir bem, depois de uma festa sem graça. Minha cabeça doía e pesava feito um tijolo acimentado. Meu corpo todo estava exausto. Parecia que tinha participado de uma daquelas maratonas de ciclismo quando você se pergunta como alguém consegue pedalar tão rápido, em tão pouco tempo. Eu só queria minha cama. Eu só queria você.

Meu cabelo estava um nó. Meu rosto sujo com maquiagem porque nem coragem e cabeça eu tive pra removê-la. Eu fui dormir pensando em você. Pensando em como eu queria estar ao teu lado, deitado de conchinha e assistindo um daqueles filmes que passa na tv. Eu saí pra festa tentando te esquecer e não poderia ter feito uma escolha mais ignorante. Como querer ficar bonita se todo o brilho que existia em mim, está com você?

Estava no banho e tudo o que eu desejava era te ver ali, me estendendo a toalha e me abraçando para me enxugar. Não aconteceu. Usei, então, o vestido mais bonito, o salto mais alto e a maquiagem mais exótica que pude encontrar. E eu me senti tola. E eu me senti feia, sem graça e enfiada num vestido que não me caía bem. Nada iria me agradar e como poderia se a minha única alegria seria a de te ver girando a chave do nosso apartamento mais uma vez? E eu me pergunto, com quem você está dormindo abraçadinho agora? A quem você está susurrando palavras de amor no ouvido? E que sorte a dela. E que sorte a sua.

Você perguntou por mim. Fiquei inquieta e rodei na cama. Baguncei ainda mais os cabelos, sem sono. Eu sinto sua falta. É o seu cheiro forte, as suas mãos grandes e o seu sorriso que parece me dizer algo. De repente tudo se misturou aqui dentro como se algo tivesse que ser encontrado. Não sei se foi. Poderia ter feito menos bagunça em mim?
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