A verdade é que eu me enchi. É assim que eu penso quase todas as manhãs, enquanto espero a sua ligação de bom dia. Cansei de você, me olhando como quem pensa se vai ou fica. Cansei de mim, tentando se ajustar às tuas teorias sem pé nem cabeça. E eu cansei da gente, tentando ficar firme só pra ver o que vai acontecer. Como se isso fosse bastante pra duas pessoas ficarem juntas. Eu não sei bem dizer como a gente acontece, mesmo sendo assim, tão improvável. Parece que vai sendo e pronto. Como pode ser, como dá pra ser ou pelo menos até quando eu conseguir tentar por nós dois. Se você só puder me dar meia certeza, eu aceito. Se você só puder me ver por meia hora, porque tem o racha com os amigos, eu topo. E assim vai. Eu, tentando ser mais o tempo todo e você tranquilo com o que vier. Eu sempre acho que to pronta pra te deixar ir sendo por aí. Mas você parece que sente quando eu to querendo cair fora e vem cheio de papo furado, com o seu andar meio engraçado e com aquele riso meio solto, sabendo que vai me desarmar. E desarma. Daí, já era. Eu vou deixando pra depois a idéia de desistir de você saindo do banheiro com a barba feita e a toalha, pendurada de lado.
Eu nunca vou entender porque você consegue me fazer ser mais sua sempre que me olha meio torto e me ataca com umas três palavras frustradas, ao dizer que eu não levo nada a sério. Eu fico me remoendo, tentando te fazer acreditar do contrário. Mesmo sabendo que, na verdade, é você que não acredita que a gente pode ter mais da gente. Eu repito, dentro de mim, umas cinco vezes que você é todo errado e cheio de mancadas e mesmo assim eu fico te querendo como se fosse tudo que eu precisasse. Já nem sei quantas vezes você já deu de ombros e fez um sinal de quem não quer nada e eu me levantei decidida a ir embora, mas torcendo pra que você me puxasse pelo braço. Só pra me fazer acreditar que era brincadeira ou um surto daqueles que a gente tem quando a cabeça tá cheia demais. Eu fico querendo me livrar de você até ouvir, lá do quarto, “vai ficar assim?”. E na mesma hora o meu coração se alegra e fica disposto a aguentar e esperar você decidir acreditar que a gente pode ser mais.
Eu já fiz cara feia, já dei piti e já fiz até promessa só pra me convencer a não me alegrar quando você diz que eu posso ter mais da gente. Eu insisti tanto nisso que eu me acostumei a ficar feliz com o meio mundo e o meio amor que o meio você me oferece sempre que quer ou sempre que não tem nada melhor pra fazer. E eu vou seguindo feliz, mesmo sendo tão infeliz às vezes. Porque eu pareço me contentar com os teus pedaços. Você me liga e eu vou correndo, querendo me doar inteira, acreditando que um dia você vai se tocar da besteira que tá fazendo e vai parar de me jogar suas partes e suas metades como se tivesse fazendo um favor pra gente. Mas é assim que é. É assim que vai sendo. E já não dói mais como doía no início. Mesmo ainda me fazendo chorar e jurar de pé junto que eu não vou esquecer o mundo toda vez que você ligar, só pra ter certeza que eu não coloquei outra pessoa no seu lugar, enquanto você estava abraçando todo mundo por aí. Menos a mim.
Eu insisto, bato o pé e faço das tripas coração só pra conseguir fazer parte da sua vida. E eu vou indo assim, de acordo com as tuas vontades. Me apaixonando por você todos os dias. E eu odeio quando você diz que a gente precisa ir mais devagar porque já sofreu demais e, dessa vez, não quer se enganar. Como se o meu coração pudesse organizar em prateleiras o que sentir a cada minuto que passa, mesmo sem ver a sua dúvida mudando um pouquinho de cor. Eu nunca vou entender porque esse teu jeito meio bruto, meio ogro e desleixado de falar, de comer, de respirar e me tocar sempre me faz querer mudar qualquer coisa em mim, só pra continuar te tendo por perto. Só pra não te fazer desistir da idéia de que eu posso valer a pena e que você pode apostar em mim. Só que dessa vez sem ser só pra ver o que vai acontecer.
Paciência. É isso que você me pede toda vez que eu baixo a cabeça e mostro um pouco do meu cansaço. Eu olho pro lado e vejo você, tão homem e tão menino, sorrindo e me fazendo acreditar que quer mesmo que a gente dê certo. E eu solto um sorriso bobo, meio cético mas bobo e volto pra casa com a alma toda reprimida. Eu rolo na cama. Eu te xingo. Eu me xingo. E eu durmo, ansiosa esperando a tua velha ligação de bom dia. E começa tudo de novo. E, assim, a gente vai sendo, sendo e eu vou indo. Pra algum lugar. Qualquer lugar. Só pra tentar te encontrar em qualquer um desses caminhos.
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